Questão interessantíssima sob análise do Cade, aqui resumida.
Em 2 de setembro de 2015, o Cade decidiu pela legalidade do compartilhamento de infraestrutura da “Sem Parar” e do “Conectcar”, qual seja, as antenas que fazem a leitura das TAGs do automóveis para pagamento automático em estacionamentos. O ganho de eficiência é evidente e dispensa comentários. Um dos riscos concorrenciais identificados referia-se à “possibilidade de que as duas empresas viessem a impedir que terceiros participassem do compartilhamento da infraestrutura, impondo a esses custos muito superiores aos seus e limitando, assim, a possibilidade de novos entrantes no mercado”. O Cade afastou a preocupação, uma vez que o próprio contrato submetido à apreciação previa “universalização” do compartilhamento “em condições [comerciais] análogas”.
Passados alguns anos, a concorrente Veloe ingressou no Cade com uma representação contra a Sem Parar, por recusa de contratar, discriminação de preços ou, enfim, “por não lhe oferecer os mesmos preços e condições do contrato por ela celebrado com a ConectCar e apreciado pelo Cade”.
A Superintendência-Geral, em nota de fevereiro último, recomendou a instauração de inquérito administrativo, mas negou a concessão de medida preventiva, que obrigaria a Sem Parar retomar as negociações nos termos e condições do contrato celebrado com a ConectCar.
De acordo com a SG, em meados de 2017 foi acordado entre Sem Parar e Conectcar aumento do preço do serviço de leitura das TAGs prestado de forma recíproca por elas. “Chama a atenção não só o expressivo aumento do valor anual pago por antena, mas também a data de tal contrato, que parece coincidir com o período de entrada de outros players no mercado e a busca, por estes, do compartilhamento de infraestrutura com as incumbentes”. Ademais, “como as incumbentes (Sem Parar e ConectCar) possuem número similar de antenas, o aumento desse valor não onera os seus custos (o pagamento de uma é compensado pela cobrança da outra). Contudo, para novas empresas que não possuem antenas ou possuem um número reduzido, a elevação desse valor eleva de forma significativa os custos de entrada e manutenção no mercado”.
A despeito disso, entendeu a SG que não estava presente o fumus boni iuris para a preventiva, pois, para tanto, seria “necessário não só averiguar a racionalidade econômica das ações da Representada, mas também examinar a atual conjuntura do mercado relevante, que passou por consideráveis alterações desde sua última análise pelo Cade, inclusive com a entrada de novos agentes em curso”.
No último dia 20, o plenário do Cade deferiu o recurso voluntário da Veloe, fundamentando sua decisão em inúmeras questões, inclusive o aumento do preço recíproco já mencionado, que estabeleceria uma referência “abusiva” para a celebração de contratos semelhantes com terceiros.
Obviamente tivemos acesso apenas à versão pública dos autos, o que limita qualquer análise. Resta, entretanto, um ponto que nos parece essencial. Como consignado pela SG, Sem Parar e ConectCar possuem número similar de antenas, de forma que compartilhavam não só o serviço em si de captação dos dados, mas também os investimentos já realizados. Digamos, um “toma lá, dá cá”, que faz com que o preço recíproco pago pelo serviço seja de menor importância, como percebido pela SG.
Porém, se não houver essa igualdade de investimentos realizados com relação à Veloe ou a qualquer outro interessado, o preço a ser praticado deixa de ser “neutro” e passa a ser necessário para remunerar o investimento assimétrico realizado pelas partes envolvidas. Em tese, a realidade material (investimentos realizados) de cada caso pode ser muito diferente, ensejando preços igualmente distintos, embora não discriminatórios.
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