O Cade, tempos atrás, dedicava o melhor de seus esforços à análise de atos de concentração, muitos dos quais sem qualquer potencial lesivo à concorrência. Aprimoramentos na jurisprudência e na legislação, que não vêm ao caso detalhar, liberaram recursos para a investigação das chamadas condutas coordenadas, os cartéis clássicos e diferentes tipos de acordo, envolvendo, por exemplo, licitações públicas. Desnecessário enfatizar a importância da persecução administrativa destas infrações à concorrência.
É desejável que, com base na experiência acumulada e no notável ganho de eficiência do Cade, o órgão possa redirecionar ou alargar o escopo de suas preocupações, de modo a contemplar, também, as chamadas práticas unilaterais. Como o nome diz, são de autoria de uma única empresa, como preço predatório, exclusividade de vendas, entre outras.
Nesse campo há um desafio adicional considerável, pois, na maioria das situações, é difícil distinguir e sopesar benefícios e prejuízos para o mercado resultantes de condutas unilaterais. É uma “zona cinzenta”, que não permite a segurança, digamos assim, acerca dos malefícios dos cartéis.
Um bom exemplo é a mais recente batalha da “guerra das maquininhas”. Lojistas, que utilizam as maquininhas da Rede, passaram a receber em apenas dois dias os valores antes recebidos em 30 dias, sem a incidência da taxa de juros cobrada pelo recebimento antecipado. O benefício, porém, cabe apenas aos lojistas que recebam os valores em uma conta no banco Itaú, controlador da Rede.
Como amplamente noticiado, de um lado estão os concorrentes da Rede, os de menor porte, que alegam que a prática implica em venda casada (condicionar a aquisição de um bem ou serviço à compra de outro) e predação (venda de algo com preço inferior ao custo); de outro, a Rede, que se defende afirmando que houve redução do prazo de recebimento (não cabendo falar em antecipação e, portanto, no custo a ela associado) e que há liberdade de escolha pelo lojista, que inclusive pode transferir o dinheiro recebido no Itaú para outros bancos.
Inegavelmente há um efetivo de benefício ao lojista, e por extensão ao consumidor, na prática da Rede. Por outro lado, em tese, há risco de eliminação da concorrência, o que possibilitaria, no futuro, práticas anticompetitivas.
No meio da contenda, a Superintendência-Geral (SG) e o Tribunal do Cade, que decidirão o que é melhor para o mercado. Ajudaria muito ao ambiente de negócios se esses órgãos definissem mais rapidamente esse tipo de questão e dessem uma sinalização clara sobre como pretendem avaliar casos envolvendo poder de mercado unilateral: prevalecerão as efetivas eficiências das práticas ou o risco concorrencial potencial?
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